02 maio 2009

Uma Historinha...



Acordou cedo, reclamando da vida. O mau-humor prevalecia, em um dia aonde trabalhar não fazia o menor sentido, ainda mais aquele trabalho. Estava o matando. Pegou o carro, um belo carro novo, e saiu em cima da hora. Mais cinco minutos pra sair e chegaria atrasado, e o chefe já não estava gostando da frequência dos atrasos. A vida estava insuportável, mas nada tinha feito ou planejava pra mudá-la.

As ruas estavam livres, semana entre natal e ano novo, muita gente tinha viajado. Ao começar a praguejar de novo lembrou da menina que fez a consciência pesar dois dólares.

Lembrou-se do ônibus que o levou uma vez pra cidade de Chichero. Pessoal de excursão, com dindin no bolso coisa e tal, e quando o ônibus parou uma visão incrível, como de toda a extensão das terras incas. Uma imensidão de montanhas e à frente, uma igreja. Como em todo templo inca, agora só restavam suas ruínas e uma igreja no lugar. Na época da inquisição destruiam tudo.

E uma porção de crianças vendendo coisas. Bolsas, luvas, camisas, mantas. Tudo. Uma porção. Uma tristeza. Pobreza. O lugar abandonado. "Compra, três dolares!", a outra "Compra esta, que bonita! Quatro dólares!" As respostas "não não depois agora não ah! olha que bonita! na volta a gente vê" e foi passear. O guia contou a história do lugar e da igreja, do que já tinha acontecido lá. A feira na porta mostrando do que mais vive, dum comércio que estava quieto. Na saída, todo mundo comprando. Era só tirar uma nota e vinham crianças com promoções, para todos. Viu uma menina que especialmente queria vender.

Ela fazia mais e mais promoções "duas por cinco!" mas ninguém levava. Quando todos estavam entrando no ônibus, ela falou prum tio "um dolar!" ele falou "levo". Ela olhou triste pro tio "dois dólar?" ele falou não e entrou no ônibus.

Lembrou-se que então o olhar da menina veio em sua direção, muito triste, e cansada, e disse "dois dólares?"... foi um tempo longo e a resposta veio firme "não obrigado"

de dentro do ônibus viu ela fazer ainda o sinal de um... um dólar pensou. devia ter comprado. por cinco. ela estava lá ainda quando pensou isso. Podia ter mudado tudo. Mas sentou-se e foi embora, com toda a excursão e comentários. Alguns sobre a pobreza, mas a maior parte sobre a história e a igreja e as coisas que baratas!

E a partir dali sua consciência começou a pesar dois dólares. Mas eram pesados e ficavam lá o tempo todo. Antes disso o peso era pequeno de outras coisas da vida. Mas esses dois pequenos dólares, que não iam faltar tanto assim, pesaram.

De breve teve que voltar. Por quê o cara da frente freiou? De Chinchero pra realidade em um décimo de segundo. Desviou do carro, praguejando contra o motorista que reduzia a velocidade bruscamente, e acelerou rápido pela pista da esquerda quando ouviu a buzina. Só deu pra ver o caminhão vindo e ...

Tinham reasfaltado a rua poucos dias antes, e as faixas de pedestre estavam apagadas. Não viu o sinal vermelho e passou batido no cruzamento.

Não viu o sinal vermelho e se foi...
com dois dólares de dívida na consciência...

Um comentário:

Anônimo disse...

Foda,

Triste escapar dessa dura realidade.

Só temos uma certeza na vida, por mais que tentamos ignorá-la, porém um dia ela nos afronta e como estaremos para afrontá-la?

Post Ducaraio, aqueles que eu queria ter escrito.

Um grande abraço.